top of page

O rendimento universal, básico, e incondicional (RUBI) e a liberdade (positiva e negativa).

A liberdade “da/de” e “para”…​

Imaginemos um náufrago que, vítima das circunstâncias e da má-sorte, dá à costa numa ilha deserta. A satisfação das suas necessidades básicas são a sua primeira prioridade. Para isso, terá que se desdobrar em diversas actividades como, por exemplo, a caça e pesca – e a preparação e confecção dos alimentos –, a apanha de frutos, o fabrico de ferramentas e a construção de um abrigo, e tudo o mais necessário para garantir a sua subsistência e segurança. Todas as suas energias e todo o seu tempo estão concentrados nesse objectivo.

O nosso Robinson Crusoe, optimista na natureza, encontra, apesar do infortúnio, uma vantagem na sua situação: não tem ninguém que o possa coagir a fazer algo que não seja de sua própria vontade; portanto, é uma pessoa livre. Ou será?

Apesar dessa sensação de liberdade completa, à medida que o tempo passa, cresce a sua vontade de poder voltar para junto dos seus, de regressar à civilização. Só desse modo poderá usufruir de todos o conforto, material e espiritual, que nela se foi construindo ao longo do tempo e que permite o desfrute do bem-estar de que os seus contemporâneos gozam, graças à especialização do trabalho e ao livre comércio entre si.

Não se podendo especializar em apenas uma ou duas das tarefas que lhe ocupam todo o tempo, acaba por ser um escravo das suas necessidades. É, em tudo, como se tivesse recuado no tempo: o seu modo de vida é idêntico aos dos caçadores-recolectores de há muitos milhares de anos atrás; o único propósito da sua vida é o da sobrevivência no dia-a-dia. Nesta ilha, tem que atender, individualmente, a todas e cada uma das suas necessidades; a especialização é um luxo que a variedade das suas necessidades – alimentação, abrigo, segurança, etc. – e a inexistência de outros “especialistas” que as possam prover, não lhe permite.

Percebe, então, que a liberdade plena só é alcançada quando, para além da libertação do jugo de terceiros, o indivíduo também dispõe da capacidade e das condições para poder conduzir a sua vida de acordo com a sua própria vontade. E a sua vontade, neste momento, era a de poder estar junto do seus, na sua terra, e de poder, também ele, participar na vida em sociedade com, claro está, a liberdade e a responsabilidade que lhes estão associados.

Este exemplo ilustra as duas definições de liberdade referidas por Isaiah Berlin, em “Two Concepts of Liberty”, de 1958. Um náufrago, numa ilha deserta, beneficia de completa liberdade negativa – i.e., não está sujeito à coerção por parte de terceiros, está livre “da/de” coerção –, mas não dispõe de liberdade, no sentido positivo da mesma: não tem as condições para agir de acordo com a sua vontade. Não é por sua própria vontade que não sai da reclusão a que se viu remetido pelo acaso. Bem pelo contrário.

…a pobreza…​

Os que, de entre nós, vítima das circunstâncias e da má-sorte, vivem na pobreza, encontram-se numa situação em que não dispõem de liberdade positiva. Toda a sua energia, no dia-a-dia, está concentrada, tal como no caso do náufrago, na satisfação das suas necessidades de alimentação, abrigo e segurança. O que gostariam de poder fazer é irrelevante; o que têm de fazer é o que determina o modo como vivem a sua vida.

Isaiah Berlin, no ensaio referido, escreve, apropriadamente, que “É costume dizer-se, muito plausivelmente, que se um homem é tão pobre que não possa comprar algo que não esteja interditado pela lei – um pão, uma viagem à volta do mundo, recurso aos tribunais –, então tem tão pouca liberdade para comprá-lo como teria se lhe tivesse sido proibido por lei fazê-lo”.

Uma grande parte da população portuguesa – 45,2%, antes de qualquer transferência social – viveria abaixo do limiar da pobreza i.e., não teria meios para poder garantir a sua subsistência, em 2016, se não beneficiasse de apoios sociais. Tendo em consideração que o valor das percentagem das pessoas no limiar da pobreza está sobreavaliado em virtude dos valores pagos aos pensionistas, se os excluirmos, a percentagem desce para 23,6%. Mesmo com os restantes apoios sociais, verifica-se que 18,3% dos cidadãos residentes em Portugal ainda continua abaixo desse limiar.

Qual é o valor em causa? €5.442,00. Por ano. Isso, €453,50 euros por mês, ou cerca de €15,00 por dia.

…e a escravidão assalariada.​

Dos outros, dos que conseguem escapar à pobreza porque tiveram a “sorte” de conseguir um emprego que lhes paga um salário suficiente para satisfazer as suas necessidades básicas, também não se pode dizer que sejam pessoas propriamente livres. Uma sondagem da Gallup, realizada em 155 países, em 2017, apurou que “apenas 15% dos mil milhões de trabalhadores, a tempo inteiro, no mundo, estão empenhados no seu trabalho”. São cerca de 850 milhões as pessoas que, em todo o mundo, não se sentem realizadas ou motivadas para desempenhar as funções que lhes estão atribuídas.

Os portugueses, infelizmente, não dispõem das oportunidades de emprego – em quantidade e qualidade – que a existência de um mercado de trabalho, verdadeiramente livre, proporciona. Nessas circunstâncias, a insegurança – senão mesmo o medo – gerados por uma eventual perda dos seus empregos – ou, o que é o mesmo, dos seus rendimentos -, torna um ser livre num escravo. As pessoas vivem toda a sua vida dependentes da avaliação e do poder de terceiros – os seus superiores hierárquicos -, em troca de algum sustento e segurança: um verdadeiro feudalismo laboral. Como Thomas Sowell disse, “Podemos tratar-nos todos por ‘camaradas’; mas há uns camaradas que têm o poder sobre a vida ou morte de outros camaradas“.

O custo, para a economia, desta situação manifesta-se, directamente, numa ineficiente alocação de recursos humanos, no desemprego, no subemprego e, na sociedade em geral, entre outros, num aumento de baixas médicas e no consumo de ansiolíticos e antidepressivos.

A proposta…​

O Partido Libertário Português defende a proposta da criação do RUBI para todos os cidadãos, maiores de idade, nascidos e residentes em Portugal. Porque qualquer grupo, ou partido político, que afirme lutar pela liberdade sem, ao mesmo tempo, respeitar a dignidade individual, mente.

Mais importante que o sufrágio universal – em que se escolhem uns quantos que, tal como quaisquer outros, procuram satisfazer as suas (deles) necessidades básicas e outras mordomias -, é a atribuição de um rendimento universal, básico e incondicional. Todos os cidadãos recebem um mesmo valor, suficiente para satisfazerem as suas necessidades mais prementes, sem quaisquer condições, perguntas, controlos, cutucadas ou asteriscos contratuais remetendo para cláusulas redigidas com letra microscópica.

Quais seriam os benefícios da adopção desta medida?

..os efeitos directos…​

Um impacto directo do RUBI é a erradicação da pobreza: todos os cidadãos verão assegurados os meios para satisfazerem as suas necessidades básicas. Nas palavras de Harry G. Frankfurt: “Do ponto de vista da moralidade, não é importante que todos tenham o mesmo. O que é moralmente importante é que cada um tenha o suficiente.

Os que não dispõem de outra fonte de rendimento poderão recuperar alguma da dignidade perdida – própria e perante terceiros – associada ao estigma da pobreza. Passam a poder redireccionar a atenção que antes dedicavam a objectivos pessoais de curto prazo – a subsistência, a segurança e o abrigo – para outros objectivos de médio e longo prazo, agindo, aqui sim, impelidos pela sua própria vontade. Adquirem, assim, a liberdade que lhes é conferida pela aumento de opções que se lhes apresentam para poderem assumir o controlo sobre o seus destinos, como adultos, e únicos responsáveis pela suas escolhas.

Para todos os outros, os que já auferem rendimentos que lhes permitam estar para além desse limiar, colocam-se oportunidades de reavaliarem as suas opções sobre a repartição do tempo dedicado ao trabalho e ao lazer, criando-se mais oportunidades de emprego, e opções de trabalho, para todos. Concretamente, passam a dispor de uma maior capacidade de negociação de propostas ou de contratos de trabalho permitindo-lhes, mesmo, recusar empregos ou trabalho indigno para qualquer ser humano no século XXI.

Na prática, a escravidão assalariada voluntária, bem como o seu reverso, a prepotência do poder, tendem a diminuir ou, mesmo, a desaparecer: o custo de oportunidade de deixar um emprego, até encontrar o próximo, torna-se muito menos oneroso. Concomitantemente, a eficiência da economia e, pricipamente, o nível de bem-estar de cada indivíduo, em geral, melhorará significativamente graças a uma mais adequada alocação dos recursos humanos, enquanto factor gerador de riqueza e de realização pessoal. Se Einstein tivesse tido acesso a um rendimento universal, básico, e incondicional, muito provavelmente não teria sido funcionário, durante sete anos, a tempo inteiro, na Repartição Federal da Propriedade Intelectual, em Berna, na Suiça, a que chamava, picarescamente, o seu “ofício de sapateiro”.

Outro efeito directo, que não é despiciendo – bem pelo contrário -, é o de acabar com todos os subsídios que se encontram listados no sítio da segurança social (e os muitos outros que existem e que não são lá referidos):

  • Maternidade e paternidade

  • Abono de família pré-natal

  • Subsídio parental

  • Subsídio social parental

  • Subsídio parental alargado

  • Subsídio por risco clínico durante a gravidez

  • Subsídio social por risco clínico durante a gravidez

  • Subsídio por interrupção da gravidez

  • Subsídio social por interrupção da gravidez

  • Subsídio por riscos específicos

  • Subsídio social por riscos específicos

  • Subsídio para assistência a neto

  • Adoção

  • Subsídio por adoção

  • Subsídio social por adoção

  • Subsídio por adoção por licença alargada

  • Encargos com as crianças e jovens

  • Abono de família para crianças e jovens

  • Bolsa de estudo

  • Fundo de Garantia de Alimentos Devidos a Menores

  • Salários em atraso

  • Fundo de Garantia Salarial

  • Layoff (a compensação retributiva é paga diretamente ao trabalhador pela entidade empregadora. A Segurança Social comparticipa a entidade empregadora com 70% desse valor).

  • Doença

  • Subsídio de doença

  • Subsídio para assistência a filho

  • Subsídio para assistência a neto

  • Doença profissional

  • Invalidez

  • Pensão de invalidez

  • Proteção especial na invalidez

  • Dependência

  • Subsídio por assistência de 3ª pessoa

  • Complemento por dependência

  • Deficiência

  • Bonificação do abono de família para crianças e jovens com deficiência

  • Prestação social para a inclusão

  • Subsídio de educação especial

  • Subsídio para assistência a filho com deficiência ou doença crónica

  • Balcão da inclusão

  • Produtos de apoio para pessoas com deficiência ou incapacidade

  • Desemprego

  • Subsídio de desemprego

  • Subsídio social de desemprego

  • Subsídio de desemprego parcial

  • Subsídio por cessação de atividade

  • Subsídio parcial por cessação de atividade

  • Subsídio por cessação de atividade profissional

  • Subsídio parcial por cessação de atividade profissional

  • Carência socio-económica

  • Rendimento Social de Inserção

  • Proteção Jurídica

  • Reforma

  • Pensão de velhice

  • Pensão social de velhice

  • Complemento solidário para idosos

  • Benefícios adicionais de saúde (CSI)

  • Morte

  • Subsídio de funeral

  • Reembolso de despesas de funeral

  • Pensão de orfandade

  • Pensão de viuvez

  • Pensão de sobrevivência

  • Subsídio por morte

Todos, sem excepção, substituídos pelo RUBI.

A criação do RUBI é uma das medidas mais eficazes, e de efeitos mais rápidos, na redução da dimensão do estado. Todas as instituições que recebem, analisam, classificam e processam a miríade de processos e de subsídios deixaria de ter razão de ser. Os seus recursos, materiais e humanos, passariam a estar disponíveis para actividades produtivas nos mais variados sectores da economia.

Mas não só: a ideia de um Serviço Nacional de Saúde, gratuito, deixaria de ser justificada. Qualquer cidadão passa a dispor, com o RUBI, de capacidade para subscrever um plano de saúde. Ou não. O que é importante, é que a escolha – e o respectivo custo – recai sobre quem a faz.

…e indirectos.​

Indirectamente, tem-se verificado que, nas experiências que já foram feitas, o RUBI contribui para a redução da criminalidade, o aumento da escolaridade, a redução da taxa de natalidade, a redução da dimensão do estado, entre outros. E, principalmente, para a liberdade de todos e de cada ser humano.

Não há almoços grátis.

Sim, há.

Na proposta do PLP, todos recebem o RUBI. Mas ninguém o irá pagar. Por outras palavras:

  • as empresas e as pessoas que hoje efectuam contribuições para a segurança social, deixarão de o fazer ; e

  • todos os cidadãos, maiores de idade e residentes em Portugal, recebem o RUBI.

Sendo que, destes últimos, o benefício para os que desenvolvem uma actividade profissional é superior porque não só deixam de ter uma despesa – o desconto para a segurança social -, como ainda passam a dispor de mais uma receita – o RUBI.

Trocamos (uma grande parte) do estado por um rendimento universal, básico e incondicional (e muito mais). Existirá melhor negócio, para todos, que este?

O Vilfredo Pareto já respondeu: seria óptimo.

Comments


bottom of page